domingo, 29 de janeiro de 2012

A Resistência das Freguesias

Pelo País cresce a resistência à decisão do Governo, a mando da Troika (manda quem pode e obedece quem deve), em extinguir várias centenas de Freguesias. Independentemente do destino de muitas delas já estar traçado, não tem sido fácil encontrarem-se argumentos que contrariem tal decisão.

Cá para as bandas do meu Concelho, arregaçou-se as mangas, criou-se um Grupo de Trabalho que se dispôs a avaliar os efeitos da possível extinção de duas das suas quatro Freguesias já “marcadas” e os resultados já são conhecidos: “- Nem pensem em extinguirem-nos as duas Freguesias! Elas fazem-nos muita falta!”

Após a leitura das Conclusões do Grupo de Trabalho (que se encontram disponíveis no site da Câmara Municipal de Sardoal) com alguma facilidade poderemos concluir que as justificações invocadas são legítimas, mas que se podem aplicar à maioria das Juntas de Freguesia Rurais que o Governo já identificou como podendo ser extintas. Por isso… não haverá muito a esperar da decisão final.

Muitas das Freguesias que agora irão “desaparecer” e que muitos tentam evitar a todo custo, já há muito haviam sido abandonadas por quem tinha o dever de lhes dar “vida” e que apenas se lembravam delas em tempos de eleições.

Um exemplo claro do que afirmo é o caso da Junta de Freguesia de Santiago de Montalegre localizada no meu concelho. Em 1960 tinha 1.032 habitantes distribuídos por 18 lugares. Em 1970 esse número desceu para 794. Em 1981 passou para 539. Em 1991 desceu para 389. Em 2001 voltou a descer para 316 habitantes. O que nos dizem agora os números relativos ao Censos de 2011? O número de habitantes é agora de 224, dos quais 41% apresenta uma idade superior a 64 anos.

Com uma área de 17 Km2, sem uma escola, sem indústrias e não “entrando nas contas” por parte de quem está ao leme da Autarquia Sardoalense (nunca ali foi investido um só metro de saneamento doméstico, há mais de 10 anos que os investimentos se centram em “pequenas borradas de alcatrão e projectos que visem a sua dinamização ou não existem ou poucos os conhecem), com toda a propriedade, poderemos dizer que o número dos seus habitantes irá continuar a diminuir uma vez que a Lei da Natureza não “perdoa” aos mais velhos e poucos são aqueles dispostos a substituí-los. Para que serve então uma Junta de Freguesia que apenas abre as suas portas por alturas da Missa Dominical e com parcos recursos financeiros que depois de pagos os subsídios aos seus autarcas pouco sobra para se fazer alguma obra? Para além da política de proximidade, a esses Autarcas, pouco mais se lhes pode exigir para além do apoio cívico e social aos seus Fregueses mais desfavorecidos ou carenciados.

Muito mais poderia aqui referir sobre o que penso acerca deste assunto e de como as Freguesias que tiveram um papel muito importante na consolidação da Democracia em Portugal, aos poucos e poucos, passaram a ser olhadas como os parentes pobres do poder Autárquico e tratadas como simples Associações cujos membros eram pagos apenas para exercerem um serviço cívico e social, tão esvaziadas elas eram nas suas competências independentemente, em muitos casos, substituírem as próprias Autarquias na realização de trabalhos que aquelas deveriam realizar e não o fazem (Ex: limpeza dos espaços públicos). E o pior (para eles) é que, em muitos casos tais trabalhos não são acompanhados por um reforço de verbas por parte de quem tinha o dever de as realizar. Que o digam as Freguesias do meu Concelho que executam tais trabalhos a troco de quase nada, como se fosse essa a sua obrigação e, tal como acima referia, “tais organismos não passarem de meras Associações de Moradores com fundos próprios”.

E se penso assim, não é só porque conheço a realidade do meu Concelho, mas também porque os números, são como o algodão (não enganam). Se não, comparemos a atenção que as 4 Juntas de Freguesia do meu Concelho e uma Associação (Filarmónica União Sardoalense) merecem por parte da Câmara Municipal.


Retendo ainda o meu olhar sobre as duas Freguesias do meu Concelho “condenadas” à extinção, tenho uma réstia de esperança quanto à possível sobrevivência de Valhascos, já que Santiago de Montalegre é um caso completamente perdido face aos critérios colocados em cima da mesa.

Valhascos viu a sua população crescer, ainda que “ligeiramente”, nos últimos 10 anos (censos de 2001 = 385 habitantes e censos de 2011 = 401 habitantes), tem fronteiras naturais perfeitamente demarcadas e um conjunto de potencialidades que lhe permitem ultrapassar a barreira do seu défice populacional assim os órgãos políticos do Concelho o pretendam.

Olhando agora o assunto de uma forma não tão apaixonada, somos obrigados a concluir que os tempos mudaram e que o tal factor de proximidade que muitos advogam que se irá perder, com a extinção das Juntas de Freguesias, talvez não seja tão evidente. As comunicações nos tempos de hoje não são as mesmas de há 40 anos e os meios que hoje estão ao nosso dispor, na esmagadora maioria dos casos, esbatem e anulam tal necessidade.

São inúmeras as Juntas de Freguesia do País, que apenas abre as portas da sua Sede à população durante algumas horas durante a semana e, para além disso, muito do trabalho que realizam pode ser facilmente executado pela Autarquia. Se assim é, porque é que nós, através dos nossos impostos, temos de as financiar? Será que, muitos daqueles que hoje vestem a pele de Autarcas dessas Freguesias, caso fossem confrontados com a impossibilidade de receberem mensalmente os subsídios a que têm direito, não renunciariam ao cargo?

Não é só a perda de um sentimento de poder que está no centro da resistência à extinção das Freguesias, mas também a perda de rendimentos já tidos como certos, que, por pouco que sejam, fazem “ sempre jeito”.

Cara ou Coroa

Retomo o Estudo efectuado pelo Grupo de Trabalho que reflectiu sobre as consequências que o Documento Verde poderá promover na organização territorial do Concelho do Sardoal.

Para além de evidenciar o facto de uma camada da população poder vir a ficar prejudicada pela eventual extinção das Freguesias de Valhascos e de Santiago de Montalegre, conclui o estudo:

… Que se constitua um conselho municipal de freguesias, mantendo as juntas como estão, mas no qual as quatro freguesias se comprometeriam entre elas a partilhar bens e recursos e que na aquisição de bens existiria uma regra em como estas seriam pensadas em conjunto por forma a existirem ganhos de escala.

Este conselho municipal de freguesias seria constituído pelos presidentes de junta, ou seus representantes, e pelo presidente da Câmara Municipal, ou seu representante.

O conselho municipal de freguesias seria o local onde as freguesias iriam procurar o entendimento entre elas, sem que nenhuma delas perdesse o seu poder e legitimidade.

Com a criação deste conselho municipal de freguesias é possível estabelecer uma afirmação territorial mais forte porque a visão do que acontece no concelho passa a ser mais global e fomentará a existência de uma preocupação mútua entre freguesias. “


Embora, profundamente céptico quanto à possibilidade das Juntas de Freguesia poderem partilhar bens e recursos, uma vez que só partilha bens e recursos quem tem e as Juntas de Freguesia do Concelho de Sardoal pouco têm a partilhar (Entre todas julgo ser possível reunir 1 retroescavadora, 2 dumpers, 3 carrinhas e até 10 trabalhadores. Para fazerem que trabalhos? Das suas competências próprias ou da competência de outros?) creio que este conselho municipal seria muito útil na partilha de experiências e informação.

E se assim é, porque se espera para a sua constituição?

Cara ou Coroa? Por enquanto… CARA! (Mais tarde logo se verá.)

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