quinta-feira, 27 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Fim

Chega hoje ao fim a História de um Sonho que tenho vindo a partilhar com todos aqueles que me vêm visitando ao longo destas últimas semanas.

Para o efeito, apenas falta acompanharem-me numa visita à Vila do Sardoal, que me acolheu enquanto seu residente em Agosto de 1992 e, por fim, a revelação do próprio sonho que jaz na raiz desta história.

Acompanhem-me numa visita à Vila do Sardoal.

Fazendo uma viagem no tempo, verificamos que dos 1076 habitantes que a Vila tinha no ano de 1960, passaram a 1042 no ano de 1970, depois para 1131 em 1981, depois para 1205 em 1991, depois 1246 para 2001 para, presentemente, se situarem, aproximadamente, entre 1100 e 1200.

Se bem se recordam do que escrevi no meu artigo anterior, quanto ao facto da Vila, nos últimos 50 anos, ter contrariado o fluxo da desertificação que tem ocorrido nos restantes lugares habitados do Município, os números revelados no parágrafo anterior confirmam a minha tese.

Mais referi que, para quem pretende “assentar a sua âncora”, a Vila do Sardoal, enquanto Sede do Município, possui serviços públicos e privados que funcionam como um “engodo” que os restantes lugares não conseguem rivalizar. Para além da existência daqueles serviços, sendo sede do Município, mal parecia se não tivesse uma rede pública de esgotos domésticos, infraestruturas desportivas, lúdicas e culturais, para além de uma malha empresarial que, embora frágil, é capaz de gerar alguns (poucos) postos de trabalho.

E porque a história deste sonho gira em torno da inter-relação entre um individuo e a comunidade onde o mesmo se insere e, ainda, num espaço temporal situado para além das fronteiras da sua casa, escola ou local de trabalho, incidamos a nossa viagem pelos caminhos da Vila que nos possam conduzir àqueles espaços.

Comecemos pelos Parques Infantis. Por incrível que possa parecer a Vila ainda não possui um espaço que possa ser classificado como tal. Porque demora? (Para aqueles dispostos a contrariar esta minha afirmação justificando-se com o Parque Infantil do Ribeiro Barato, aconselho que o visitem. Á entrada da porta e do seu lado direito uma placa designa aquele espaço de Parque Infantil destinado a crianças dos 4 aos 12 anos. Mais se pode ler que é proibida a entrada a animais. Ultrapassem a porta que abre para dentro (não deveria abrir para fora?) e que se encontra permanentemente aberta (não deveria ter uma mola para se manter permanentemente fechada?) e pisem aquele espaço com o chão coberto por carrasca de pinheiro ardido e que remonta à sua inauguração, há alguns anos. Pensem nos animais que por ali demandam e lembrem-se de uma família de javalis que há algumas semanas atrás entendeu visitar a relva junto àquele parque e efectuar “prospecções” naquele espaço. Diante tudo isto, digam-me, se será que se pode chamar àquele espaço de Parque Infantil? Eu creio que não.)

No que respeita a jardins e espaços verdes, o Jardim da Tapada da Torre, o Jardim da Praça Nova (ou das Tílias) e o Parque de Merendas, convidam a um momento de repouso, ainda que, qualquer deles, não deixe de apresentar algumas deficiências. Nos dois primeiros a sombra é uma excelente companhia no Verão. No último, a ausência de sombras convida o seu uso apenas no Inverno. Nos dois primeiros, a inexistência de Instalações Sanitárias públicas condiciona todos aqueles que necessitem de tais instalações. A alternativa é irem ao café mais próximo (a Instalação Sanitária pública em frente do Banco Millenium BCP pode ser opção ao Jardim da Praça Nova, mas… sinceramente… quem é que, depois de a conhecer, não opta preferencialmente pela instalação sanitária de um Café próximo? No Parque de Merendas, a Instalação Sanitária ali existente continua a responder positivamente a todos aqueles que a procuram, pese o facto do seu isolamento estar “à mão” de uns quantos actos de “selvajaria” (neste aspecto há que louvar a acção da Autarquia na manutenção continua da sua limpeza diária, mesmo durante os fins de semana).

No que concerne à existência de espaços de lazer e desportivos, as Piscinas Descoberta e Coberta são um excelente atractivo para quem pretenda ter um contacto directo e privilegiado com o elemento água, quer no Inverno ou no Verão. E se não me custa dar nota alta àquelas infraestruturas, já me custa valorizar as outras opções que restam. Com excepção do ringue que em boa hora a Junta de Freguesia de Sardoal construiu há alguns anos, junto ao Bairro da Santa Casa da Misericórdia, e onde duas balizas de futebol de 5 e uma tabela de basquetebol convidam à prática de alguns exercícios físicos sem se estar condicionado a ter de ultrapassar primeiro uma porta permanentemente fechada (é o que acontece com o ringue do Polidesportivo que leva muitas vezes os nossos jovens a terem de “trepar” por cima da porta para poderem aceder ao mesmo), a Vila do Sardoal quase que parou no tempo desde que foi construído o ringue e o campo de futebol (há quantos anos?). Agora que a Câmara Municipal de Sardoal se presta para colocar um tapete de relva sintética no campo de futebol parece estar de volta a vontade de se voltar a apostar em infraestruturas desportivas. O que, quer eu quer qualquer outro Sardoalense pede é que o entusiasmo não se perca e que, de entre as disponibilidades financeiras da Câmara se encontrem saídas para se dotar os espaços desportivos de condições de uso para todos os intervenientes, quer sejam praticantes ou assistentes. Com este investimento no Piso sintético é dado um passo significativo na melhoria das condições para a prática do futebol. É verdade que o Polidesportivo tem dois balneários/vestiários para os jogadores, uma cabina para os árbitros e umas bancadas para alguma assistência, mas só isto chega? É claro que não. Obrigar o público a sair do Polidesportivo e buscar a barreira dos troncos dos eucaliptos localizados no exterior ou ser obrigado a andar cerca de 200 metros para aceder às instalações sanitárias do Quartel dos Bombeiros, e desse modo poder responder a necessidades fisiológicas que o invada, é no mínimo desconfortável para quem vive neste século. O incómodo que tal situação por vezes promove, muitas vezes, é o bastante para desmotivar todo aquele que tenha vontade de ali se deslocar.

Para terminar a visita aos espaços desportivos uma palavra apenas para aqueles que não existem. Sou capaz de aceitar que a concretização do sonho em se construir um pavilhão gimnodesportivo venha sendo permanentemente adiado por motivos que se prendem com o seu custo não ser compatível com a liquidez financeira do Município. Porém custa-me a aceitar que até hoje ainda não se tenham construído dois campos de ténis, pese o facto de já ouvir tal vontade há anos. Que diabo, quanto custaria à Autarquia a construção de dois campos de ténis em terra batida (ou mesmo em cimento), uma parede de alvenaria e todo este conjunto cercado por rede com 4 a 6 metros de altura? Possivelmente ficaria mais económico que algumas actividades que aqui me dispenso de indicar e cuja existência tem como único propósito a valorização da imagem de alguém.

Quanto à existência de espaços culturais, a Vila está muito bem servida no que respeita a uma sala de espectáculos, mas mal servida no que concerne a espaços que designo de “oficinas de cultura”. Com a construção do Centro Cultural, a Autarquia Sardoalense conseguiu voltar a dinamizar algumas actividades culturais que o Município há muito desconhecia, por dependerem em exclusivo de uma casa de espectáculos e espaços nobres passíveis de serem utilizados por um significativo número de pessoas em simultâneo. Quando se sabe que tais actividades não geram receitas suficientes que permitam cobrir as suas despesas e quando se conhece as fortíssimas limitações financeiras da Autarquia há que aplaudir todos os “ginastas” que têm conseguido aliar a apresentação de bons produtos culturais com recurso a baixos investimentos. Só que se a nota que se pode atribuir à dinâmica do Centro Cultural é francamente positiva, já quanto às “oficinas de cultura”, a nota a atribuir à Autarquia deverá ser negativa. Há quem queira aprender e há quem esteja disposto a ensinar. Para quando espaços condignos para o GETAS e Filarmónica? Ainda pensei que o Antigo Lagar dos Paulinos pudesse responder às necessidades urgentes de, pelo menos, uma destas Associações, mas parece que o entusiasmo se desvaneceu ultimamente. Será que isso tem a ver com outras opções essenciais à afixação de uma cruz em boletins de voto?

Sobre a Vila do Sardoal, muito mais se poderia afirmar sobre as valências que possui ou que deveria possuir. Contudo, no panorama geral do Município, não restará dúvidas a ninguém que as condições de vida que patrocina a todos aqueles que nela residam são infinitamente superiores às condições disponíveis para além das suas fronteiras.

A revelação do Sonho

Para dar por concluída esta minha história apenas resta revelar o sonho. Ao longo destas semanas deixei escapar várias vezes o mesmo. É simples:

Um dos caminhos que pode conduzir à desertificação de um lugar é, para além da ausência de infraestruturas básicas e postos de trabalho, a não existência de condições que permitam aos seus residentes interagir saudavelmente entre si e com os outros.

Não é preciso inventar o que já há muito está inventado. “Que bom seria poder ver disseminado pelo Município do Sardoal, a reprodução daquelas infraestruturas de lazer e desportivas que um pequeno bairro de 25 a 30 famílias localizado no interior de Moçambique já possuía nos longínquos anos de 1960 e 1970, e que ainda hoje, alguns deles ainda são capazes de desafiar a acção do tempo!”

Durante algum tempo mantive viva a possibilidade de poder ser um agente decisor na transformação desse sonho em realidade. Porém, há algumas semanas atrás, quis o destino que essa possibilidade se tenha desvanecido por completo. Hoje, como o sonho ainda permanece, só me resta esperar que outros o materializem.

EU ACREDITO QUE É POSSÍVEL.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 8

Para terminar o périplo de breves visitas pelas Freguesias do Município do Sardoal falta apenas a Freguesia do Sardoal.

Acompanhem-me, então, pelos caminhos da minha Freguesia, a Freguesia de Sardoal.

Com uma superfície de 33 quilómetros quadrados, a Freguesia de Sardoal possui 12 lugares habitados, incluindo claro está, a Vila com o seu próprio nome.

O processo de desertificação nesta Freguesia não tem sido tão acentuado como nas outras Freguesias do Município, mas não deixa de existir. Dos 3142 habitantes que residiam na Freguesia no ano de 1960, passaram para 2743 no ano de 1970, depois 2368 no ano de 1981, depois 2312 em 1991, depois 2319 em 2001 e, seguramente, menos de 2300 neste ano de 2008. Concorre para o meu juízo de que hoje existem menos de 2300 habitantes na minha Freguesia em virtude de, em 2001, 25% da população já apresentava uma idade superior a 64 anos, contrastando com os 15% que apresentava uma idade inferior a 15 anos. Para além deste pormenor, os eleitores inscritos nesta Freguesia no ano de 2005 eram de 2034 enquanto que os números actualizados a 31 de Dezembro se situam em 2012.

Diante dos números acima apresentados e se tomarmos como referência o ano de 1970 e não o ano de 1960 (ano de referência adoptado para as outras Freguesias) poderá concluir-se que o decréscimo da população não foi significativa e quem dera que tal variação também se tivesse verificado nas outras Freguesias. Tal deveu-se, em exclusivo, ao acréscimo real da população na Vila do Sardoal que, de algum modo, compensou as perdas verificadas nos outros lugares da Freguesia.

É verdade que a localização dos serviços públicos e privados principais são um “engodo” muito forte para todo aquele que não sabe onde assentar a sua âncora. Quem não gosta de viver perto de uma escola que pode garantir aos seus filhos toda a sua formação escolar até à entrada no ensino superior? Quem não gosta de viver perto de um Hospital ou Centro de Saúde? Quem não gosta de viver perto dos serviços públicos (Câmara Municipal, Conservatória, Finanças, etc) ou privados (Bancos, consultórios médicos, serviços especializados, etc? Quem não gosta de viver, o mais perto possível, do seu posto de trabalho ou onde possa desenvolver a sua actividade profissional?

Se juntarmos a tudo isto, a existência de alguns espaços lúdicos, de lazer e desportivos, temos um “cocktail” perfeito para percebermos a razão pela qual a Vila do Sardoal tem “conseguido” conter, o processo de desertificação que se verifica para além das suas fronteiras e no espaço que resta do Município a que pertence.

Nesta visita à minha Freguesia e em busca das condições de vida que são facultadas a todos aqueles que nela habitam, não é difícil de percebermos que existem duas realidades distintas, para além dos limites da Vila do Sardoal: os lugares com pouca ou nenhuma gente jovem e os lugares com alguma gente jovem. Se uma comunidade não apresenta um equilíbrio na sua estrutura etária algo não está bem. Todavia, quando tal desequilíbrio advém da inexistência de jovens que possam compensar a “partida” dos menos jovens já não se poderá afirmar que algo não está bem, para se passar a afirmar que tudo está mal. E tudo está mal porque, diante de tais dados, não será difícil prever-se o fim dessa comunidade num espaço temporal de uma ou duas gerações.

Havendo realidades tão distintas nesta Freguesia julgo que a visita que hoje vos proponho seja feita apenas aos lugares existentes para além dos limites da Vila do Sardoal, deixando a visita a esta para o próximo artigo.

Comecemos então por visitar os lugares com pouca ou nenhuma gente jovem. Para o efeito selecciono São Simão, Entrevinhas e Venda Nova. São Simão, dos 155 habitantes em 1960, restarão menos de 50 nos dias de hoje. Entrevinhas, dos 238 habitantes em 1960, restarão menos de 80 nos dias de hoje. Venda Nova, dos 103 habitantes em 1960, presentemente restarão cerca de 50.

- Será que estas três comunidades têm algo em comum, para além de se encontrarem, umas mais do que outras, num processo de desertificação difícil de conter?
- É claro que têm.

- Qualquer delas não tem um sistema público de recolha de esgotos domésticos, o que condiciona, desde logo, todo aquele que ali queira viver. Só um grande “amor à terra” é capaz de influenciar alguém a viver num local onde não existe tal infraestrutura e ser obrigado, por via disso, a possuir uma Fossa Séptica e estar permanentemente condicionado à disponibilidade dos serviços camarários em a despejar sempre que se encontre cheia. E quando a história mostra que entre a requisição e a execução do serviço podem passar largos meses, é preciso ter-se, mesmo assim, uma grande amor à terra para ali se continuar a viver. Até que um dia, o amor acaba…

- Qualquer delas não tem um espaço para os jovens poderem praticar um desporto, por mais simples que ele seja.

- Em qualquer delas, se os membros dessas comunidades quiserem confraternizar entre si, apenas lhes resta um café, que nem sempre está permanentemente aberto. E como a “cultura da cerveja” e o jogo da “sueca” tradicionalmente é mais cultivada pelos homens, às mulheres, para além de um café e de umas conversas de oportunidade, pouco resta. Isto é, os residentes destes três lugares, se quiserem viver o tempo que o trabalho e as vivências que o lar dispensa, são obrigados a buscar outras paragens e outras comunidades. Para os mais velhos já só resta o caminho de casa para a sua horta (quando ainda podem) e recordar pontualmente o passado, quando a oportunidade se depara, entre vizinhos.

- Qualquer delas possui uma Associação que, ou está moribunda, ou caminha a passos largos para esse estádio. Tirando o “entusiasmo de alguns resistentes” que teimam em lutar contra a adversidade da desertificação e que os leva anualmente a promoverem uma festa de Verão, pouco resta. Não é difícil de prever o desfecho para quando estes, poucos, resistentes já não conseguirem resistir ao cansaço que o associativismo provoca. É que, simplesmente, não têm quem os possa substituir.

Se mais provas do que acabo de afirmar não fossem suficientes para demonstrar o que pode estar subjacente à desertificação destes lugares, a Venda Nova é um claro exemplo. Mesmo com uma excelente inserção na malha viária regional e nacional, uma topografia favorável à construção e um ambiente saudável, muito poucos são aqueles que escolhem tal espaço para viver, pese os loteamentos particulares ali promovidos.

Passando aos lugares que apresentam uma estrutura social mais equilibrada e que se localizam para além dos limites da Vila do Sardoal, a nossa visita passará agora por Andreus e Cabeça das Mós. Em Andreus, dos 551 habitantes que havia em 1960, restarão, aproximadamente, cerca de 300. Em Cabeça das Mós, dos 682 habitantes que ali residiam em 1960, já só restam cerca de 260.

- Estas duas comunidades, de algum modo, conseguiram nos últimos 20 anos conter a velocidade da desertificação, embora qualquer delas (mais Cabeça das Mós) tenham todas as condições para inverter tal desígnio.

- Ambas possuem uma rede pública de esgotos domésticos. (Não lembra ao diabo que a Câmara e Assembleia Municipal de Sardoal, no ano de 2006, tenham aprovado um protocolo com a Empresa Águas do Centro S.A., para que esta assuma a responsabilidade de tratar as águas e esgotos de todo o Concelho, durante os próximos 30 anos, e, naquele, Cabeça das Mós não figurar como possuindo qualquer estação de tratamento de esgotos. E não possuindo tal infraestrutura, Cabeça das Mós ficou fora dos propósitos de investimento da Concessionária, na área do Tratamento de Esgotos Domésticos, durante tal período de tempo. E não lembra ao diabo porque, mesmo depois de eu ter alertado para o facto do protocolo ser omisso quanto à existência das ETAR´s de Cabeça das Mós e Monte Cimeiro/Vale das Onegas, foi entendido que o facto de não figurarem no protocolo, a “Águas do Centro, S.A.” assumiria na mesma tais compromissos. “- Aqui só entre nós, que ninguém nos houve, quando subscrevemos um contrato com alguém, alguma vez poderemos reivindicar o que dele nada consta? Se assim fosse, para que serviriam os contratos? É preciso ter lata!...”)

- Tanto Andreus, como Cabeça das Mós, têm uma Associação e, justiça seja feita, a dinâmica de Cabeça das Mós é francamente superior à de Andreus. O espaço da Internet e a sua biblioteca são alternativas para quem queira confraternizar com outros sem que para isso tenha de ter um copo ou cartas numa das mãos.

Enquanto que em Cabeça das Mós existe um ringue que convida a uma partida de futebol de 5 (quando é que alguém é capaz de dar o grito do Ipiranga denunciando a existência de mais desportos para além do pontapé na bola?) pese apresentar algumas deficiências que há muito requerem correcção, já Andreus tem um pequeno espaço com características de parque infantil mas onde as cautelas dos “pais galinhas” não aconselham muito o seu uso (aquele banco de areia, onde se encontram instalados aqueles quatro aparelhos, deve ser um “paraíso fecal” para os cães e gatos das redondezas. Há quantos anos é que aquela areia não é substituída e porque é que aquele espaço não se encontra vedado e com sombras?).

- “E que mais há nestas duas localidades que possa aguçar a vontade de alguém aí querer assentar a sua âncora?” - Perguntarão.

- “Não há mais nada, para além de uma excelente localização em termos de acessibilidade às redes viárias regionais e nacionais” - responderei.

Que falta fariam a Cabeça das Mós e Andreus aquelas infraestruturas de lazer, culturais e desportivas que aquele bairro de 25 a 30 famílias, localizado no centro de Moçambique, já possuía há cerca de 40 anos e que em artigos anteriores já descrevi!...

(No próximo artigo de “A História de um Sonho” convidá-los-ei para concluírem comigo a visita à Freguesia de Sardoal, desta feita, visitando por fim a Vila do Sardoal)

terça-feira, 18 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 7

No último artigo convidei-vos para me acompanharem numa visita à Freguesia de Valhascos, acompanhem-me agora numa visita à Freguesia de Santiago de Montalegre.

Visitemos, então, a Freguesia de Santiago de Montalegre

Com uma superfície de 17 quilómetros quadrados, a Freguesia de Santiago de Montalegre dos 17 lugares habitados que apresentava em 1960, já só possui 12, encontrando-se os outros 5 numa situação de “lugares fantasma”.

O processo de desertificação nesta Freguesia tem sido tão acelerado que não encontro palavras que me permitem classificá-la. Dos 1032 habitantes que residiam na Freguesia em 1960, passaram para 794 em 1970, depois 539 no ano de 1980, depois 389 em 1991, depois 316 em 2001, para hoje o número já se situar claramente abaixo da fasquia das três centenas. A este propósito refira-se, ainda, que o número de eleitores inscritos passou de 365 em 2001, para 325 em 31 de Dezembro de 2007 (alguns destes eleitores, embora residindo noutras paragens, o seu amor àquela terra ainda os impede de alterar o seu lugar de recenseamento). Se a estes números juntarmos, ainda, que em 2001 a percentagem de jovens com uma idade inferior a 15 anos era de apenas 7,2% (23) e a percentagem dos menos jovens com uma idade superior a 64 anos era de 40% (316) penso que não restará dúvidas a ninguém que a situação desta Freguesia, no que concerne ao número dos seus habitantes é… DRAMÁTICA!

Para quem não conhece aquela Freguesia e a visita pela primeira vez, rapidamente conclui que, não fora a existência de algumas estradas ou alguns caminhos asfaltados, e as redes de abastecimento público de água e electricidade, quase que poderia perguntar, que mal aquela gente fez para a sociedade se ter esquecido dela? A sensação que se tem é que parou no tempo vai para muitos anos.

A única escola primária existente na Freguesia, há muito que já fechou.

Não existe um único lugar com rede pública de recolha e tratamento de esgotos. Quem necessitar de tal serviço, é obrigado a construir uma Fossa Séptica própria e esperar meses para que a Autarquia recolha os efluentes ali depositados. Nem com a adesão do Município do Sardoal ao Sistema Multimunicipal das “Águas do Centro, S.A.” houve qualquer vontade em se prever tal possibilidade para os próximos 30 anos. (A este propósito, ainda hoje não consigo perceber porque é que Deputados Municipais que residem naquela Freguesia foram capazes de aprovar tal adesão mesmo sabendo das lacunas que a mesma enfermava e que comprometiam seriamente o futuro da sua Freguesia.)

Os postos de trabalho quase que se podem contar com os dedos de uma mão. No que respeita a espaços de lazer ou desportivos, não existe um ringue, não existe um parque infantil, não existe… nada.

Da mesma maneira que no último artigo referi o jeito que não faria à Freguesia de Valhascos os equipamentos lúdicos e desportivos que tinha aquele bairro de 25 a 30 famílias, há 40-50 anos e perdido no centro de Moçambique, também sou capaz de agora afirmar que, possivelmente, de nada serviriam na Freguesia de Santiago de Montalegre.

A situação é tão grave que ainda hoje não percebo porque é que o sino da Igreja de Santiago de Montalegre ainda não tocou a rebate, chamando todos os Fregueses daquela Freguesia para que, em conjunto, possam encontrar uma saída para o problema que a desertificação a todos toca. Porque esperam?

Aquilo que a Freguesia, neste momento, pode oferecer a quem ali queira passar a residir é de tal forma escasso, que desconfio seriamente que mesmo que a terra fosse doada, dificilmente haveria quem, proveniente de outras paragens, estivesse disposto ali investir.

(No próximo artigo de “A História de um Sonho” convidá-los-ei para uma visita à Freguesia de Sardoal)

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 6

No último artigo convidei-vos para me acompanharem numa visita à Freguesia de Alcaravela, acompanhem-me agora numa visita à Freguesia de Valhascos.

Visitemos a Freguesia de Valhascos
Com uma superfície de 8,3 quilómetros quadrados, a Freguesia de Valhascos possui apenas um lugar que é a própria aldeia de Valhascos. O flagelo da desertificação também atingiu esta Freguesia que viu a sua população de 883 habitantes em 1960 passar para menos de 400 habitantes nos dias de hoje. Se a estes números juntarmos o facto de, aproximadamente, 40% da sua população apresentar uma idade superior a 64 anos e, aproximadamente, 12% se inserir no grupo etário inferior aos 15 anos, rapidamente podemos concluir que o curso da desertificação se agravará a muito breve prazo.

Efectuando uma visita a este lugar, depressa se percebe que é um lugar que apresenta características exclusivas habitacionais onde os postos de trabalho que aí se geram são reduzidos e com uma expressão nula.

Valhascos tem condições intrínsecas que poderiam captar a atenção de todos aqueles que, trabalhando no Município do Sardoal ou nos Municípios vizinhos, pretendessem instalar-se num sítio calmo, seguro, “soalheiro” e com todas as infraestruturas que os novos tempos não dispensam.

Pese o facto de haver alguma “desordem” na sua rede viária urbana (A maioria dos arruamentos ainda apresenta a mesma largura desde há muitas dezenas, ou até mesmo centenas, de anos, inviabilizando que duas viaturas se cruzem ao longo da mesma via e obrigando a que uma delas recue para o cruzamento mais próximo. Isto deve-se unicamente ao “desinteresse” manifestado por todos os políticos que têm governado a Autarquia Sardoalense. É certo que o alargamento das vias de comunicação dentro das fronteiras urbanas nem sempre é pacífica face aos interesses dos particulares. Neste caso, ou em quaisquer outros, é sempre necessário que o bom senso oriente uma decisão. Não digo que todo este processo de alargamento das vias se tenha de concretizar num espaço de tempo definido, mas ele deve de estar planeado e sempre que a ocasião surgir poder ser executado. Um dia abordarei especificamente este tema.) a ligação de Valhascos às redes viárias regionais e nacionais é excelente. Se juntarmos a tudo isto a existência de uma rede de saneamento doméstico (que cobre a maior parte da aldeia), para além das redes de abastecimento de água, luz e telefones estão reunidas as condições julgadas essenciais para alguém que para ali queira vir engrossar o número dos seus habitantes.

Pondo-me na “pele” de alguém que pretendesse residir em Valhascos existiriam sempre duas questões que contribuiriam decisivamente para a minha decisão: o espaço da habitação em si e a vida da comunidade onde a habitação se inseriria.

Quanto à primeira questão eu procuraria “fugir” do interior da aldeia para poder “fugir” aos condicionalismos que a exiguidade dos arruamentos me proporcionariam e procuraria uma parcela de terreno, totalmente urbanizado, junto a um arruamento com duas vias e com boa ligação às outras redes viárias regionais. Julgo que os eixos Cemitério da Cabeça de Mós – Barca do Pego e Valhascos (centro) – Zona Industrial de Sardoal poderiam responder perfeitamente aos meus anseios. A Revisão do Plano Director Municipal deveria prever tal possibilidade através do aumento do perímetro urbano ao longo destes eixos.

Quanto à segunda questão, que envolveria a minha vivência para além do meu espaço de trabalho e da minha casa, vejamos o que a comunidade Valhasquense teria para me oferecer.

- Se eu tivesse um filho de tenra idade teria de inventar algumas actividades para o “entreter”. Porque é que não existe um Parque Infantil em Valhascos?

- Se o meu filho entretanto estivesse em idade escolar, não teria quaisquer problemas ao nível escolar porque Valhascos possui todas as condições nesta área. É certo que quando se é pai ou mãe, os nossos instintos paternais fazem com que reivindiquemos que a escola se localize junto à nossa casa para melhor protegermos os nossos meninos. Tal não sendo possível o que esperamos é que as instituições a quem os “entregamos” cumpram com o seu dever, quer enquanto guardeões da sua segurança, quer enquanto educadores dos seus conhecimentos e saberes. E para além dos limites da escola, o que é que a comunidade poderia oferecer ao meu filho para que ele possa “gastar” a energia que pudesse guardar dentro de si? Contrariamente à Freguesia de Alcaravela, Valhascos tem um ringue aceitável onde 2 balizas convidam ao futebol de 5, algumas “brincadeiras” e pouco mais (honra seja feita à Associação de Valhascos que pese todo o tipo de problemas que a assolam, desde a legalização dos espaços onde se encontra instalada, até aos problemas de liquidez financeira que condicionam a implementação dos seus projectos, e que têm vindo a “cansar” o espírito associativista e comunitário dos seus dirigentes, mesmo assim é capaz de gerar algumas sinergias sociais). Porque é que não existe uma piscina pública? Porque é que não existe um campo de ténis? Porque é que não existe um espaço destinado aos jovens onde estes para além de poderem conviver entre si, possam explorar em conjunto o mundo do “ciberespaço”?

- Agora eu que gosto de libertar o meu espírito através de conversas entre amigos ou “carregar baterias” através da prática de alguma actividade desportiva ou lúdica, onde encontraria um espaço sem que estivesse sujeito à influência da “cultura da cerveja”?

- Se entretanto levasse comigo os meus pais, em que as suas idades já aconselham a paz de um jardim e um espaço de convívio próprio entre as gentes das suas idades, espaço esse dotado de condições que pudessem responder às suas limitações físicas, o que Valhascos me poderia oferecer? Porque é que Valhascos não tem um Jardim público, por mais pequeno que seja? Porque é que as suas gentes mais velhas não têm um espaço público próprio sem ser aqueles bancos postados ao longo da sua praça central, espaço esse onde pudessem “viver melhor os seus dias”?

Valhascos tem condições para inverter o rumo da desertificação a que tem sido votado nos últimos 50 anos. Para tal apenas é preciso que os Valhasquenses se unam e criam as condições de vida que presentemente os limitam e condicionam. (Lembram-se das condições de vida que tinham aquelas 25 a 30 famílias há 40 anos num bairro perdido no centro de Moçambique e que já anteriormente referi? Que jeito fariam em Valhascos!)


(No próximo artigo de “A História de um Sonho” convidá-los-ei para uma visita à Freguesia de Santiago de Montalegre)

terça-feira, 11 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 5

Dando sequência à História de um Sonho, convido-vos agora a fazerem uma visita ao Concelho que me acolheu em 1991 e que, desde então, adoptei como meu.

A visita que vos proponho tem um propósito perfeitamente definido: perceber a desertificação continuada a que o mesmo tem sido sujeito, pese todos os investimentos permanentemente anunciados pela Autarquia.

Assim, gostaria de vos pedir que, na visita ao meu Município dispam a capa do sentimento que a terra ou o lugar lhes possam suscitar, enquanto cenários de gerações que vos precederam, e perguntem a vós próprios: este é o lugar ideal para eu viver?

Todos nós somos portadores de pensamentos que resultam de experiências que a vida nos facultou. Não sendo possível que dois corpos ocupem, em simultâneo, o mesmo espaço no mesmo tempo, vale por dizer que as respostas à pergunta que formulo, ainda que possam resultar num simples Sim ou Não, estarão sempre associadas a uma infinidade de justificações, consoante a visão que cada um possa ter sobre o assunto.

Visitemos a Freguesia de Alcaravela

Com uma superfície de 34 quilómetros quadrados, a Freguesia de Alcaravela, constituída por 20 lugares habitados, viu a sua população dos 1797 habitantes, em 1960, reduzir-se para os cerca de 1.000 habitantes, actualmente. Se só por si este decréscimo, que tem sido continuado, é preocupante, o facto de 30% da sua população se inserir num grupo etário com uma idade superior a 64 anos e menos de metade dessa percentagem se inserir no grupo etário inferior aos 15 anos, transforma este caso preocupante num caso alarmante.

È certo que, a este processo de desertificação se encontram associados várias causas, desde a ruptura da economia local, que assentava basicamente nos recursos naturais em torno da floresta a qual, por sua vez, não foi acompanhada com o aparecimento de uma outra economia tão forte quanto aquela, até à deficiente projecção de planeamentos urbanísticos, que pela cegueira da pressa imposta para a sua implementação, mais enfraqueceu o que já fraco se encontrava.

A resposta a tão brutal desígnio levou os seus naturais e residentes a dois caminhos: o êxodo para fora das fronteiras da Freguesia e do Concelho ou a aceitação da realidade tal qual ela se lhes deparava. Desses caminhos existem muitas histórias de sucessos e fracassos, contudo, o que conta para esta história é que, são cada vez mais aqueles que optam pelo trilho do êxodo e já poucos os que teimam em contrariar a adversidade que os invade.

A primeira vez que tive contacto directo com esta Freguesia ocorreu por volta dos anos de 1979/1980 quando por motivos profissionais fui incumbido de fiscalizar obras públicas no Município do Sardoal (Reservatório Elevado de Casal Pedro da Maia, Escola de Monte Cimeiro/ Vale das Onegas, entre outras). Já naquele tempo, mesmo para quem, como eu, vivia fora daquele espaço, a percepção que já então tinha, era de que a sua malha social apresentava alguns sinais de fragilidade. A este propósito lembro-me, ainda, quando por vezes aos sábados à tarde visitava Santa Clara (por motivos de uma forte amizade por alguém que durante algum tempo aí fixou residência) e via os campos cultivados e salpicados de gente voluntariosa com vontade de vencer, a admiração que tal gente provocava em mim.

De então para cá, o que temos vindo a assistir é que aquela Freguesia que uma vez uma Estrada Nacional (244-3) durante muito tempo separou os Caminhos de Cima e os Caminhos de Baixo, já não apresenta tal “fraccionamento”, mas apresenta agora um outro tipo de “fraccionamento”: A ausência de uma identidade própria que possa ser comum a todos os seus residentes.

Anualmente, durante um fim-de-semana vive-se intensa e apaixonadamente dentro das fronteiras do “nosso lugar” ou da “nossa aldeia”. Os vizinhos transformam-se em elementos de uma mesma família, as Festas de Verão acontecem e o êxito das suas festas está garantido. E se tal coesão se revela durante um fim-de-semana e no seio de uma comunidade pertencente ao mesmo lugar, o que acontece nos restantes dias do ano quer no seio da mesma comunidade ou na interacção com as outras comunidades da Freguesia?
Tirando as manhãs de Domingo em que a Fé convida à Missa Dominical e o Mercado Semanal convida a uma compra de oportunidade, o resto é… “cultura da cerveja” e pouco mais.

Para se poder conversar com alguém, vai-se ao Café e… bebe-se. Para se jogar às cartas, vai-se ao Café e… bebe-se. Para se jogar matraquilhos ou bilhar vai-se ao Café e … bebe-se. Será que não existem alternativas. E a verdade é que, não só não existe alternativa como também a prática continuada deste estilo de vida é ela própria a promoção à desertificação.

Lembram-se das tais condições de vida que há 40 anos aquele bairro de 25 a 30 famílias concediam aos seus moradores e que eu descrevi nos artigos anteriores de “A História de um Sonho”?

Porque não existe em Alcaravela um Parque Infantil público para os mais jovens?

Porque não existe em Alcaravela uma Piscina Pública onde os mais novos e mais velhos possam desfrutar de umas “horas de lazer molhadas” em alternativa à Rosa Mana, que, sinceramente, não passou de uma boa intenção desfasada no tempo em muitas dezenas de anos?

Porque não existe em Alcaravela um ringue permanentemente aberto à população onde se possam praticar alguns jogos desde futebol de salão, voleibol, basquetebol, e outros? (A este propósito há que louvar todas as iniciativas que a Associação da Presa tem feito neste sentido e no interior do seu pavilhão, só que não deixa de ser um espaço encerrado e com um uso reservado).

Porque não existe em Alcaravela um simples campo de ténis público?

Porque não existe em Alcaravela um espaço público onde todos possam conviver, independentemente da sua idade ou sexo sem estarem condicionados à necessidade de terem de consumir o que é que quer que seja?

Para que serve uma espécie de ringue que foi construído em Santa Clara que não apresenta um único traço marcado no seu pavimento ou equipamento fixo para que ali se possa desenvolver uma única actividade de lazer ou desportiva? E havendo, será que as condições de segurança para tal prática poderia ficar garantida com os desníveis que apresenta face ao terreno envolvente?

Para que serve o único jardim localizado junto ao mercado diário em Santa Clara se apenas existe “vida” em seu redor aos Domingos de manhã?

Para concluir esta visita à Freguesia de Alcaravela deverei revelar que no meu sonho vejo em Santa Clara:

- Uma piscina com 25x12 metros para os mais adultos e uma outra piscina onde as crianças possam estar em plena segurança, apoiadas por uma estrutura de apoio composta por Vestiários/Balneários e um Snack-bar com uma ampla esplanada;

- Um ringue desportivo com condições para a prática de alguns jogos (futebol de 5, patinagem, basquetebol, voleibol e outras);

- Dois campos de ténis e uma parede de treino;

- Um Parque Infantil;

- Um complexo de edificações para convívio, acessos à Internet e outros.


Para que este sonho tivesse o sucesso desejado e pudesse funcionar como pólo aglutinador de todas as sensibilidades, na administração de todo este complexo de lazer e desportivo, teriam lugar, para além de um representante da Autarquia e da Freguesia, um representante de todas as Associações em actividade em Alcaravela.

Este sonho tive-o aquando das Autárquicas de 2005 quando me candidatei à Presidência da Câmara Municipal de Sardoal e coloquei-o nas minhas prioridades estratégicas para o Concelho. Três anos depois continuo a acreditar que Alcaravela precisa mesmo destas valências para que ela possa ser geradora de um magnetismo especial que promova a unidade e um ideal de vida entre todos os Fregueses de Alcaravela.

Será que quando a conjuntura não favorece a criação de postos de trabalho e as pessoas são confrontadas diariamente de não terem à sua disposição uma qualidade de vida saudável, será que não estão reunidas as condições que possam favorecer a desertificação do espaço onde residem?

É urgente que os Alcaravelenses se unam em torno de um objectivo comum a todos. O sucesso do futuro do Município do Sardoal depende do dinamismo e sucesso de todos os seus habitantes.

(No próximo artigo de “A História de um Sonho” convidá-los-ei para uma visita à Freguesia de Valhascos)

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 4

Vou tentar concluir hoje a descrição dos espaços de lazer que tive à minha disposição durante a minha juventude nas longínquas paragens africanas. E se os descrevo é porque pretendo provar o porquê de por vezes afirmar que todos nós, que vivemos neste pequeno Município, que dá pelo nome de Sardoal, poderíamos ter uma melhor qualidade de vida. Mas isso ficará para os próximos números de “A História de um Sonho”.

Regressando de novo ao passado…

Os Campos de Ténis

Na margem Sul do jardim, um espaço totalmente vedado com rede, encerrava 2 campos de ténis e uma parede onde se aprimoravam os reflexos para a sua prática(ao longo da qual uma pequena faixa pintada revelava a altura normal de uma rede que separa os campos adversários).

Reconheço que não foi um espaço que eu frequentemente utilizava. No entanto sempre que a ocasião se proporcionava aí íamos nós “bater umas bolas”. Todavia quando andava no 4º ano do liceu, era rara a semana que não fazia umas partidinhas com a “Mariquita”. Julgo que se chamava Maria do Rosário, vivia no bairro da Lusalite, era economista e… minha professora de matemática. Ainda hoje a “culpo” por, ao longo da minha vida académica, ter sido sempre um razoável aluno naquela disciplina. (Como os meus colegas sabiam que éramos amigos, vizinhos e jogávamos ténis, eu tinha de lhes provar que as boas notas que tinha não provinham da amizade, mas sim do facto de saber. Essa era razão que me obrigava a estudar mais do que eles. Com isso ganhei o gosto pela matemática e nunca mais o perdi.)

O Campo de Tiro ao Alvo

Conforme referi anteriormente, era política do Estado Novo, que a população branca residente em Moçambique estivesse permanentemente organizada, de modo a poder responder, pela força, a uma possível sublevação dos indígenas (comunidade negra moçambicana). A O.P.V.D.C.M. (Organização Provincial de Voluntários da Defesa Civil Moçambicana) era a imagem visível dessa política.

Por isso, não era de estranhar que tivéssemos à nossa disposição um campo de tiro ao alvo, onde pudéssemos aprimorar a nossa pontaria com armas de fogo. Tais campos de tiro ao alvo encontravam-se espalhados pelos mais diversos bairros. A 6 quilómetros de distância do nosso, havia logo outro pertencente à Nova Maceira (fábrica de cimentos pertencente a António Champalimaud).

No nosso campo de tiro, que se localizava a uma centena de metros do Jardim, apenas praticávamos tiro com armas de pressão de ar e calibre 22 (os exercícios com Mauser, Walter e G3, eram realizados no campo de tiro da Nova Maceira).

Com uma capacidade até 25 atiradores em simultâneo, aí praticávamos tiro a alvos localizados a 10, 25, 50 e 100 metros. Os tiros eram sempre feitos nas posições de deitado, de joelhos e de pé. Nunca nos faltava a manta para nos deitarmos, o rolo para colocarmos no peito do pé e os binóculos para sabermos, tiro a tiro, a eficiência dos disparos, sem termos de nos deslocarmos aos alvos.

Com a minha pressão de ar e a minha “ponto 22” (Espingarda Checa Brno) obtive vários troféus e medalhas, a maioria delas obtidas na posição de pé, por força do hábito de andar sempre á caça da passarada. E nunca nos faltavam as munições para treinarmos. Sem vento lá tinhamos as balas normais de cápsula bronzeada. Já quando o vento "incomodava" utilizávamos as balas de alta velocidade com as cápsulas prateadas. A “ponto 22” por não ser uma arma muito barulhenta e por ter um efeito mortal muito grande, era uma arma proibida para a caça grossa.

O Escutismo

Pese todas as valências que o bairro apresentava, mesmo assim, ainda “tínhamos de ser escuteiros”. De acordo com a visão desse grande homem (Engº Jorge Pereira Jardim) era importante, ainda, que nos fossem facultadas “ferramentas” que nos poderiam ser muito úteis para quando deixássemos de ser jovens e passássemos a ser homens e mulheres.

E assim foi construída uma sede (possivelmente a única sede de escuteiros alguma vez construída em que a sua geometria é uma flor de lis) e foi criado o Grupo 29 da Associação dos Escuteiros de Portugal. Dividida ao meio, o lado esquerdo da Sede pertencia aos rapazes liderados pelo Chefe Augusto Aleixo (empregado da Lusalite) e o lado direito pertencia às raparigas que eram lideradas pela Chefe Maria Teresa Jardim (esposa do mentor).

Uma faixa de floresta (tipicamente tropical onde não faltavam as altas árvores, lianas e uma imensidão de animais selvagens desde a mais simples cobra até aos “chatos” dos macacos-cães) dava-nos o prazer de explorarmos o desconhecido. Ainda hoje quando me recordo que, sempre que pretendíamos acampar no seu interior, as limpezas das clareiras, para aí montarmos as nossas tendas, eram sempre acompanhadas de uma matança de cobras e que havia noites em que circulávamos no interior da mesma guiando-nos apenas pelos clarões dos pirilampos, me dá arrepio na "espinha". Era preciso ter uma grande dose de loucura para não recear o medo. Mas será que quando se é jovem não se transporta essa dose de loucura? Não éramos diferentes dos jovens que nos antecederam e que nos precederam no tempo.

(Um dia, do baú das minhas memórias, ainda retirarei algumas histórias que aquela floresta me proporcionou e aqui, neste meu blogue, as contarei.)

Reflexão final

Antes de voltar a dar um salto de regresso ao meu espaço e ao meu tempo julgo ser importante que todos aqueles que me acompanham nesta história percebam o que sinto quando lamento as condições de vida que o Concelho do Sardoal proporciona a todos aqueles que aqui residem independentemente da sua idade.

Porque é que passados 40 – 50 anos depois daquelas 25 a 30 famílias terem tido todas aquelas condições de vida, ainda hoje uma comunidade com cerca de 4.000 almas (à qual pertenço) não possui tais condições e a sua diversão basicamente é conseguida à custa de uma garrafa de cerveja nas mãos?

Que tipo de identidade e coesão uma sociedade pode ser construída sobre tais alicerces?


(Para aqueles a quem esta história do meu passado de jovem tenha despertado alguma curiosidade convido-os a visitarem o que resta de todos os espaços lúdicos, desportivos e culturais que descrevi. Acedam ao Google Earth (versão 2008), introduzam o nome “Dondo, Mozambique” e desloquem o cursor para as coordenadas 19º 37´ 40” (Sul) e 34º 45´ 22” (Este). Aí chegados encontrarão o Clube (19º 37`39,15” S e 34º 45`22,80” E), o “Ringue” (19º 37`41,22” S e 34º 45`21,62” E), a Sede dos Escuteiros (19º 37`42,80” S e 34º 45`23,15”), o Bairro da Lusalite e a Floresta. Boa Visita! Os que não conseguirem e estejam interessados podem procurar-me que os ajudarei nessa visita).

(No próximo História de um Sonho – Parte 5 passarei a abordar o presente)

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A História de um Sonho - Parte 3

Dando continuidade à história de um sonho, hoje falarei do “Ringue” e do Jardim que serviam aquela pequena comunidade onde cresci e que dava pelo nome de Bairro da Lusalite, no Dondo, em Moçambique, e entre os anos de 1968 e 1976.

O “Ringue”

Quando saíamos do clube, o Ringue, a cerca de 60 – 80 metros surgia de pronto diante dos nossos olhos. Com o revestimento em betão afagado apresentava dimensões mínimas para a prática dos desportos designados de salão (hóquei em patins, basquetebol, voleibol, andebol, futebol de salão e outros). De formato rectangular, nos topos a rede metálica (tipo galinheiro), que se desenvolvia por uns 4 metros de altura, impedia que as bolas se perdessem para além dos limites do campo após as tentativas falhadas de se acertar nas balizas. Num dos lados maiores havia uma pequena bancada que servia para incentivarmos as nossas equipas com os célebres cânticos do “Rapa o Tacho” em que a nossa equipa estava sempre em cima e os nossos adversários sempre em baixo, e no outro lado maior, para além da protecção da rede, uma tela de cenário permitia que pontualmente assistíssemos a algumas exibições cinematográficas.

O "nosso" desporto-rei era o hóquei em patins. Conforme já anteriormente referi aquelas poucas famílias eram suficientes para “alimentarem” as equipas desde o escalão de infantis até aos seniores. Era rara a casa que não "contribuisse" com um jogador. Só a família Ramiro “contribuiu” com 4. Depois era os Narciso, o Marçal, o Aleixo, o Crispim, o Tó e muitos mais. Da minha casa o “contributo” resumiu-se ao meu irmão mais novo.

Os patins nos meus pés só sabiam andar para a frente e “recusavam-se” a travar a não ser que as tabelas lhes aparecessem á frente. “Burro velho não aprende línguas”. Quando calcei uns patins pela primeira vez tinha já perto de 14 anos. Os trambolhões fizeram com que eu percebesse que deveria escolher outra modalidade. A maioria dos meus amigos que jogavam hóquei quase que aprenderam primeiro a patinar e só depois a andar.

Para aqueles que se recordam dos feitos desportivos de Portugal nos anos de 50 e 60 não lhes será estranho os nomes de: Fernando Adrião, Bouçós, Velasco e outros. Eram na altura os melhores jogadores do mundo na modalidade de hóquei em patins. Pois bem, Velasco chegou a jogar e a treinar o meu clube na sequência de um convite que lhe foi formulado para trabalhar e residir na Lusalite no Dondo. Os nossos resultados desportivos, acreditem, que não eram de deitar fora e muitas vezes disputámos os campeonatos provinciais de Moçambique nas diversas categorias. Se bem me recordo chegámos inclusivamente a sermos primeiros.

Se o hóquei em patins era a modalidade primeira, o futebol de salão masculino e feminino vinha em segundo lugar. Aqui privilegiava-se mais a prática e menos a competição. E se é verdade que a “colunável Cinha Jardim” às vezes tocava na bola, a Lina é que era a nossa “Ronaldinha”. Aquele pé esquerdo fazia miséria. Quando aquele pé acertava bem na bola, marcava golo de baliza a baliza. Mesmo nós, quando, na brincadeira jogávamos contra ela, sempre que ela rematava a menos de 6 metros da baliza, aquele que tinha a responsabilidade de defender a baliza que ela atacava só tinha uma alternativa: com uma mão protegia a cara e com a outra o baixo-ventre e esperar que ela falhasse o corpo e a bola fosse ao lado. A bola chutada era de uma violência fora do vulgar.

Sobre aquele ringue muitas histórias se poderia contar, mas para a história que estou presentemente a contar julgo ser importante referir que, caso não chovesse, aquele campo de jogos, todos os dias tinha jovens a utilizá-lo.

O Jardim

As memórias que eu tenho do jardim, que se iniciava logo junto ao ringue, não são tão claras como aquelas que eu tenho dos outros espaços lúdicos. Recordo-me do “mar de sombras" que as altas árvores tropicais promoviam, os relvados, os caminhos em terra batida e o som da passarada. Era o local ideal para aqueles que, sendo mais velhos que nós, procuravam um espaço para conversarem ou tomarem conta dos filhos ou netos mais pequenos. Para isso não faltavam os baloiços, um banco de areia e até uns “cavalos” que, às vezes, também faziam a nossa “delícia” e que não passavam de uns bidões apoiados numas molas helicoidais, qual “rodeo”.

E no interior do Jardim, lá estava uma Capela muito simples, sempre aberta para o exterior convidando a uma oração. A irreverência da malta nova não dava muita importância a isso (como muitos de nós depois de vivermos um pouco a vida nos transformamos e passamos a olhar para esses espaços com outros olhos e outros sentimentos). Para nós, a Capela era mais para os nossos pais.

Enfim, se alguém pretendia refugiar-se e ficar sozinho com os seus pensamentos, aquele Jardim era o sítio ideal.

(No próximo História de um Sonho – Parte 4 falarei dos campos de ténis que se localizavam na extremidade do Jardim, do lado oposto ao Ringue, do campo de tiro ao alvo que se localizava logo a seguir e da Sede dos Escuteiros (Associação dos Escuteiros de Portugal Grupo 29) localizado nas traseiras do ringue e afastado deste cerca de 60 metros.)