sábado, 28 de agosto de 2010

Presidentes de Juntas de Freguesia

Esta semana, as notícias deram conta que os Presidentes de Juntas de Freguesia, a tempo inteiro e a meio tempo, estavam sem receber desde o início do ano. De acordo com o Presidente da ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias) tal deve-se ao facto do Estado ainda não ter procedido à transferência dessas verbas, independentemente de se encontrarem aprovados, para esses fins, 5 milhões de euros no Orçamento do Estado para 2010. (A Lei 11/96, de 18 de Abril, através do seu artigo 10º refere que as verbas necessárias para responder a estas despesas são asseguradas directamente pelo Orçamento de Estado aprovado pela Assembleia da República).

Como resposta, Fonte Oficial do Ministério das Finanças disse à Lusa que “a verba consta do Orçamento do Estado e o ministério não colocou, nem coloca qualquer oposição à disponibilização da verba orçamental que está afecta ao pagamento dos presidentes de Juntas de Freguesia”.

Por sua vez, a Secretaria de Estado da Administração Local, “responsável” por tal atraso confirma que estas verbas ainda não foram pagas porque "o valor aprovado (5 milhões de euros) é manifestamente insuficiente para o pagamento de todos os elementos das Juntas de Freguesia abrangidos pelo regime de Permanência". Numa nota enviada à Lusa, fonte oficial do gabinete liderado por José Junqueiro explica que, "notoriamente, os cálculos da oposição não foram correctos, o que coloca agora a Administração Local numa situação de injustiça. Ou paga a alguns presidentes de junta e não paga a outros, ou, enquanto não houver uma solução equitativa, não vai criar uma situação de injustiça entre pares". De acordo ainda com o Secretário de Estado a culpa é da oposição que fez mal as contas ao terem proposto para inclusão no Orçamento do Estado 5 milhões de euros, quando eram necessários oito milhões.

Se entendo hoje trazer este assunto aqui a este meu cantinho é porque me lembro muito bem da reacção do Governo quando a oposição apresentou esta proposta de 5 milhões de euros e que pela voz do Ministro das Finanças considerava esta proposta uma afronta, uma vez que a Lei das Finanças Locais já incorporava o montante necessário para remunerar os membros eleitos das Juntas de Freguesia e que o que estava em causa era, apenas e só, “money for the boys”.

Isto é, quando o Governo entende ignorar a Lei 11/96, de 18 de Abril, ao propor a inscrição de ZERO EUROS no Orçamento de Estado para a remuneração dos Presidentes das Juntas de Freguesia a tempo inteiro ou a meio tempo, vem agora o mesmo Governo (ainda que outra voz) acusar a oposição de falta de sentido de responsabilidade por ter proposto e aprovado apenas 5 milhões de euros, quando eram necessários 8 milhões de euros.

Perceberam? Se há coisas que me surpreendem é o facto de tudo isto ser dito sem se rirem. Notável!

A este propósito (“Money for the boys”) muito se disse e se escreveu. Recordo uma passagem de um artigo (Antes pelo Contrário), publicado no Expresso, pelo jornalista Daniel de Oliveira em 12 de Março de 2010: “… Dá-se o caso da quantia que se propunha pagar aos milhares de presidentes de Junta ser, mais euro menos euro, a mesma que, sozinho, um jovem sem currículo, Rui Pedro Soares, recebia como administrador da PT para tratar dos recados do PS. E para boys destes, que ninguém conhece até estalar um escândalo, em quem ninguém vota e que fazem a sua escalada profissional à sombra de boas relações partidárias, nunca faltou money."

Para os que desconhecem, apenas 8% das 4.259 Freguesias deste País reúnem os requisitos mínimos para que os seus Presidentes possam exercer o mandato a tempo inteiro ou a meio tempo. Não está ao alcance de todas as freguesias terem mais de 10.000 eleitores ou mais de 7.000 eleitores e 100 Km2 de área (Presidente a Tempo Inteiro) e entre 5.000 eleitores e o máximo de 10.000 eleitores ou mais de 3.500 eleitores e 50 Km2 de área (Presidente a Meio Tempo). De acordo com informação obtida um presidente no regime a tempo inteiro, numa freguesia com mais de 20 mil eleitores, aufere de remuneração mensal mais despesas de representação, cerca de 2.400 euros brutos (sem descontos).

E se hoje aqui trago este tema é porque esta semana conheci um Presidente de uma Junta de Freguesia que pertence aos tais 92% que não são abrangidos pela Lei 11/96 e que a Lei das Finanças Locais determina uma compensação para encargos na ordem dos 300 euros mensais. E que destino dá este Presidente a esta verba que mensalmente tem direito? Segundo ele, vai por inteiro para uma Instituição de Carácter Social.

Conheci JAPG na sequência de uma resposta a um convite para apresentação de uma proposta para a elaboração de um Projecto Térmico para uma Moradia unifamiliar a construir num Concelho a cerca de 75 Km do Sardoal. Com a proposta aceite elaborei o respectivo projecto a quem entreguei pessoalmente em Julho/Agosto do ano transacto.

Iniciada a construção da sua casa, JAPG foi-me pondo ao corrente da evolução da mesma (sempre através de e:mails) até que diante de uma situação mais complexa entendi ser tempo de ir conhecer a obra e esclarecer o seu proprietário das dúvidas que o assolavam.

Visitada a obra e prestados todos os esclarecimentos técnicos associados ao comportamento térmico da habitação, o meio-dia “aconselhou” um almoço entre nós.

Ia o almoço a meio quando JAPG se “descaiu” ao afirmar que era Autarca e Presidente da Junta de Freguesia de X.

Não foi preciso muito para perceber que estava diante de um jovem (trintas e poucos) que contraria a tese de que todos os políticos não prestam e que o que os move são interesses pessoais. E essa percepção não foi conhecer o destino da tal “compensação mensal que aufere”, nem perceber que tais “migalhas” poderiam “compor” o seu vencimento de funcionário público, mas o entusiasmo que revelava nos projectos já executados e em curso.

A Freguesia com 321 habitantes (censos de 2001) e uma superfície de 83 Km2 (para se perceber melhor estes dados ao nível do Concelho do Sardoal, a Freguesia de Santiago de Montalegre com 17 Km2 apresentava 316 habitantes nos Censos de 2001 e a Freguesia de Valhascos, com 8,3 Km2 apresentava 385 habitantes nos mesmos censos), possui um sítio na Internet onde é possível percebermos a sua vitalidade.
- Em 2009 as receitas e as despesas equilibraram-se no valor dos 89 mil euros (as despesas maiores incidiram nos Encargos com o Pessoal em cerca de 61.300 euros, do qual apenas 8.500 euros se destinaram aos titulares dos Órgãos de soberania;
- Já existe uma cobertura da Internet WIFI (Internet Sem Fios) em cerca de 60% da Freguesia, prevendo-se a cobertura integral para breve (para quem resida na Freguesia e pretenda aceder à Internet em sua casa, de uma forma gratuita, bastará possuir um computador com placa de rede “Wireless” e procurar na sede da Junta de Freguesia o respectivo “username” e a “password”;
- O ano passado foram atribuídas 10 bolsas de estudo a estudantes residentes na Freguesia, com o valor individual de 50 euros cada (entende-se por estudante aquele que frequenta o ensino pré-escolar, 1º ciclo, Secundário, Universitário e Profissional);
- Na quarta, quarta-feira de cada mês a reunião do executivo é pública e tem o seu início ás 20:30 horas;
- Etc.

O que ressalta da visita ao sítio da internet desta Freguesia nem é o facto do mesmo ter sido premiado com 5 estrelas no ano passado, mas a transparência na informação que revela. Simplesmente notável. Tiro o meu chapéu a JAPG e seus colegas autarcas pelo trabalho que desenvolvem em prol da comunidade a que pertencem. Assim outros os pudessem seguir.

Relativamente ao assunto inicial deste artigo, sobre a não transferência para as Freguesias das verbas destinadas ao pagamento dos Presidentes de Junta de Freguesia a meio Tempo e a Tempo Inteiro, alguém tem dúvidas que ela só resulta do facto de haver, cada vez menos, “pilim” nos cofres do Estado?

Isto está a ficar feio!!!

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