sábado, 4 de setembro de 2010

A Lei 3/2010

Numa semana dominada pela leitura da sentença do Processo da Casa Pia (para que termine definitivamente ainda faltarão quê: 5 anos?... 10 anos?... 15 anos?...) e do Processo do Seleccionador Nacional movido pela ADoP (não é preciso sermos adivinhos para percebermos que o desfecho aqui vai ser muito mais rápido: despedimento), já para não falarmos da prestação da selecção nacional no jogo que realizou contra o Chipre, emergiu uma notícia que passou despercebida a muita gente: Entrou em vigor na passada 4ª feira (1 de Setembro) a Lei n.º 3/2010.

E que Lei é esta que eu dou tamanha atenção? Passa a ser obrigatório o pagamento de juros de mora pelo Estado pelo atraso no cumprimento de qualquer prestação pecuniária.

Do mesmo modo que ao longo dos tempos venho criticando a actuação do Governo liderado por José Sócrates reconheço que esta medida merece que o elogie.

De uma forma muito sintética: “ … O Estado e demais entidades públicas, incluindo as Regiões Autónomas e as Autarquias Locais, estão obrigados ao pagamento de juros de mora (presentemente e com base no Despacho n.º 597/2010 é de 8,00%) pelo atraso no cumprimento de qualquer obrigação pecuniária (para além de 30 dias após a data de aceitação da dívida), independentemente da sua fonte...”

Embora a Lei n.º 3/2010 tenha sido aprovada em 12 de Março e publicada em 27 de Abril, a sua entrada em vigor apenas ocorreu no passado dia 1 de Setembro de modo que o Estado e as Entidades Públicas pudessem normalizar as dívidas que tinham pendentes à data.

Se houve quem percebeu a dimensão desta Lei, também houve por certo quem a poderá ter menosprezado ignorando-a numa lógica de que quando ela entrar em vigor logo se verá. Por isso não será de estranhar que a mesma possa ter eco a partir de agora. A Lei não refere que os juros de mora se aplicam apenas sobre dívidas assumidas após a entrada em vigor da Lei, o que implica que a mesma se aplica a todas as Dívidas assumidas e não liquidadas pelo Estado e Entidades Públicas. (Por exemplo: Quando nos cofres de algumas Autarquias já escasseiam as moedas e a tal dívida que há anos não era paga porque o seu valor era superior ao valor das moedas disponíveis, o que vai acontecer quando esse valor a pagar for inflacionado com juros de mora?).

- Será que era correcto que na sequência de um fornecimento de um material ou prestação de um serviço a uma Entidade Pública um empresário tivesse que “mendigar” o que lhe era devido trilhando labirintos de falsas promessas, muitas vezes tratado como se de um vulgar pedinte se tratasse?

- Será que era correcto que um empresário sendo credor do Estado, para cumprir com o próprio Estado em matéria de impostos, tivesse de recorrer ao crédito para que não fosse penalizado em caso de incumprimento?

- Quantas dívidas se vão arrastando pelos “corredores” das Autarquias Locais apenas porque de um lado existe a vontade de alguém ganhar dinheiro com a venda de um bem ou serviço e do outro alguém, que não tendo possibilidade de pagar esse bem ou serviço, vai iludindo o pagamento com promessas de aquisição de mais bens ou serviços?

- Será que uma das saídas para a crise não é o próprio Estado passar a ser tão rigoroso na hora de pagar as suas dívidas como o é na hora de receber o que lhe é devido? (Se uma Autarquia não emite uma Licença de Construção, uma Ligação de um Ramal de Esgotos, etc, sem que antes o Munícipe proceda ao seu pagamento, porque é que, de igual modo, não procede ao pagamento de uma factura apresentada por uma empresa sobre um bem ou serviço já efectuado?)

- Quantas empresas neste País não encerraram as suas portas porque o Estado se “esqueceu” de lhes pagar o que lhes devia e os juros que a Banca lhes cobravam se tornaram insustentáveis?

- Porque é que as Empresas privadas tinham de suportar desmandos eleitoralistas de alguns políticos que invocando falta de liquidez financeira que não lhes permitia satisfazer as suas dívidas, em paralelo, eram capazes de “esbanjar” dinheiros que diziam não possuir, na hora de “afirmarem” as suas capacidades de liderança?

A implementação da Lei irá trazer muitos amargos de boca a todas as Autarquias que ao longo dos anos conseguiram lidar com Dívidas a Terceiros impossíveis de eliminar sem o recurso a empréstimos de longo prazo (que a Lei agora lhes veda) ao mesmo tempo que os seus responsáveis, para "continuarem a alimentar a máquina” optavam por aumentar ainda mais essa dívida e, quem viesse atrás que resolvesse o seu pagamento. Até quando mais isto poderia durar?

Quem não tem dinheiro, não tem vícios.

P.S. – A este propósito da entrada em vigor da obrigatoriedade de pagamento de juros de mora pelo Estado pelo atraso no cumprimento de qualquer obrigação pecuniária, lembro-me muito bem das minhas preocupações, enquanto responsável político local, sobre as dívidas acumuladas e registadas nas Prestações de Contas da Câmara Municipal do Sardoal dos exercícios entre 2003 e 2007. Até das hostes dos meus “pares” recebi críticas porque as minhas preocupações não “davam votos” e não deveria ser tão “contabilístico”. Pois é! O resultado está aí.

Nesta matéria, desconheço o ponto da situação do meu Concelho (deixei de fazer os “trabalhos de casa” e não é o facto da Prestação de Contas de 2009 revelar uma dívida a terceiros de 1,52 Milhões de Euros distribuída por 293 entidades diferentes quando em 2008 tal dívida era de 2,06 Milhões de Euros distribuída por 328 entidades que me permite emitir qualquer juízo de valor sobre esta matéria).

Direi mais, o facto de neste mandato haver nomeações para cargos políticos e contratação de serviços por ajuste directo, nunca antes efectuados, com os respectivos acréscimos nas despesas que os mesmos promovem, levam-me a concluir que ou se está diante de uma pujança financeira nunca antes vivida ou diante de um acto irreflectido. Recuso-me a pensar na segunda hipótese, uma vez que os responsáveis sabem seguramente os possíveis efeitos da implementação desta Lei que agora entrou em vigor.

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