domingo, 9 de maio de 2010

Braço de Ferro

Tudo leva a crer que o bom senso parece querer assentar arraiais lá para os lados de São Bento. A força do Ministro mais musculado e credível do Governo (Teixeira dos Santos) parece ter vencido o 1º round do braço de ferro com o Primeiro-Ministro (afinal já existem, pelo menos, duas obras que não se irão realizar tão cedo: o novo aeroporto e a 3ª travessia do Tejo).

No meu último artigo dei conta da “confusão estratégica” que se gerou após a reunião do Concelho de Ministros realizada no passado dia 31 de Março. Lembram-se? De um lado estava o Ministro das Finanças que dizia que deveriam ser repensadas as Obras Públicas previstas, especialmente aquelas para as quais o Governo ainda não tivesse assumido qualquer compromisso, para além de não afastar a hipótese do aumento dos impostos, caso tal fosse necessário para o controlo do défice. Do outro estava o PM (o Ministro das Obras Públicas funciona como “carteiro” do Chefe) que afirmava que todas as obras previstas seriam executadas e que apenas seria repensado o projecto relativo à “auto-estradas do Centro”.

Já quanto ao TGV a teimosia imperou (será que ela não decorre do facto de alguém já ter assinado um compromisso com Espanha, sem total autorização para o efeito, e agora não pretender passar por irresponsável dando o dito por não dito?) e o projecto vai avançar. Se tudo der certo, os “pais” deste projecto aparecerão (com todo o direito) para reivindicar os louros. Mas se a coisa cair para o lado do torto, desaparecerão de cena e outros que tratem de corrigir o que estiver mal. Todavia, caso sejam instados a pronunciarem-se e não tiverem saída, de certo não faltarão as desculpas da praxe e de entre elas lá aparecerão alguns vulcões islandeses impossíveis de prever.

O 2º round do braço de ferro deverá ter lugar dentro de alguns meses quando o Ministro das Finanças concluir da inevitabilidade do aumento de impostos para o controlo do défice. Aí veremos quem ganhará de novo. Até lá…

Todos nós deveremos participar na reabilitação financeira do País. Tal desígnio deverá levar-nos a pensar sobre qual a melhor forma de colaborarmos nesta “guerra”, para a qual fomos lançados por gente em quem confiámos para gerirem os nossos destinos.

O meu papel está há muito definido e nada mais posso fazer para além do que já faço: trabalhar, ter rendimentos e pagar os impostos devidos sobre os rendimentos auferidos. Se não trabalhar, não ganho. E os outros?

Será que o grande problema não reside naqueles que tendo o dever de gerirem o dinheiro que o Estado lhes confia não o fazem devidamente? Será que não radicará aqui a raiz de todo o nosso problema?

Exemplo 1: Alguém desconhece o que tem sido a prática dos nossos eleitos para que se perpetuem no poder? Ele é electrodomésticos, caminhos asfaltados, empregos… Tudo vale.

É verdade que tem sido feita alguma coisa no sentido de se contornar tais desmandos, mas “eles” arranjam sempre forma de contornar as barreiras (leis) que se lhes erguem. O ponto de ruptura no capítulo de empregos há muito que foi atingido, porém arranja-se sempre forma de se meter mais alguém, independentemente desse alguém não ser necessário nem mais valia. Nesta área do “emprego-favor” as Autarquias dão meças aos demais organismos públicos. Não digo que em todas as 308 Autarquias a doença da “Lei da Pescada” impere, mas não estarei longe da verdade se afirmar que numa esmagadora maioria delas tal aconteça. Porquê?

Exemplo 2: Porque é que o empenho profissional dos funcionários do Estado não é o melhor?

Penso que não há qualquer espécie de dúvidas que existem funcionários públicos cujo desempenho deverá ser classificado de excelente, mas todos sabemos que tal desempenho não é acompanhado por todos. O pior que esta assimetria promove é que é mais fácil desincentivar quem mais trabalha do que incentivar quem o não faz. Não sei se o problema é da ausência de leis específicas que possam punir os infractores ou da inépcia de quem manda. O que é certo é que este problema existe e contribui fortemente para o défice que o País enfrenta.

Em qualquer empresa privada deste Planeta é o trabalhador que “cava” o seu salário, cabendo à sua entidade patronal ser o seu fiel depositário. “Se alguém recebe o que não merece, alguém fica a perder”. (No Canadá há vinte anos foi despedido um engenheiro de uma Câmara Municipal por… não trabalhar. Nem o vínculo de muitos anos no quadro de funcionários o salvou. Em Portugal, pode-se despedir um funcionário por vários motivos, mas será que existe alguma lei que o permita como consequência directa de não trabalhar?)

Exemplo 3: Alguém já se perguntou se o cinto que nos pedem para apertar até 2013 vai voltar à sua forma original antes do aperto?

Pois bem… ainda não ouvi um único economista confirmar tal tese. Todos têm sido unânimes que, possivelmente, o pior ainda está para vir. As contrapartidas do Estado sobre obras realizadas no âmbito de projectos público-privados estão previstas para lá dessa data.

Porque será que nos recusamos a aceitar a ideia de que a avaliação de qualquer político não depende da obra física que ele possa deixar para a posteridade? Quantas obras nós conhecemos que foram elogiadas, referenciadas como marcos governativos e, passados poucos anos ou foram abandonadas sem que fossem concluídas ou viraram ruínas? Diante disto, o que dizer dos investimentos aí realizados (próprios, nacionais e comunitários)? Até dói só de pensar que algumas dessas “ruínas” ainda hoje não se encontram totalmente pagas à instituição bancária que as financiou, decorrendo “normalmente” o seu pagamento.

Porque será que muitos projectos são definidos numa lógica temporal curta à medida do mandato de quem a tutela? Isto é, porque é que o seu grau de importância é avaliado pelo que hoje poderá significar uma vez que o amanhã é longe e até lá muito poderá acontecer? Nesta lógica o que dizer de alguns compromissos que se estendem muito no tempo e sobre os quais não ouve cuidados acrescidos em salvaguardar os interesses de todos nós.

Tanta coisa há para fazer e corrigir!

Post Scriptum: Esta semana, alguém que no passado decidiu lutar contra a ditadura vigente antes do 25 de Abril, de uma forma diferente de outros, assumiu-se candidato a Presidente da República Portuguesa. A forma como o fez terá magoado muitos portugueses que nada tinham a ver com a Ditadura. Muitos desses Portugueses ainda hoje estão vivos e não se esquecem. Eu sou um deles. Poderá até ser eleito, mas nunca com o meu voto.

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