domingo, 27 de abril de 2008

A Lógica (?) dos números

Na próxima 3ª feira, dia 29 de Abril, a Assembleia Municipal de Sardoal irá reunir para discutir e aprovar (?) a Prestação de Contas do Exercício de 2007, já aprovada, em Reunião do Executivo Municipal, no passado dia 9 de Abril.
Para os mais distraídos poderei dizer que se vão discutir um conjunto de algarismos e letras dispersos por algumas centenas de páginas. Esse emaranhado de algarismos e letras, pelo volume impressionam o leigo, pelo conteúdo causam calafrios a todo aquele que tem a responsabilidade de o conhecer para poder emitir a opinião que o cargo, do qual está investido, exige. EU VOTEI CONTRA!
E porque a discussão da Assembleia Municipal não deverá abordar o volume que fazem as centenas de páginas, que constituem a Prestação de Contas de 2007, mas sim a sua substância, estou curioso por conhecer os juízos de quem apenas foi eleito para defender a Comunidade que os elegeu.
Quanto à substância poderei afirmar categoricamente que o rigor, em matéria de alguns números, esteve de férias quando os Documentos foram elaborados. Se dúvidas houvessem, a defesa que o Presidente da Câmara fez sobre os mesmos no dia 9 de Abril são esclarecedores. Senão veja-se:
- Afirmar que o aumento do endividamento de curto prazo durante o ano de 2007 cresceu mais 90 Mil Euros muito por culpa das despesas que a Câmara teve de assumir numa obra por administração directa na qual gastou em materiais 275 Euros e envolveu funcionários do quadro da Autarquia, é claramente não saber o que está a dizer.
- Afirmar duvidar da capacidade dos próprios Serviços da Autarquia estarem em posição de saberem, quase 4 meses depois, qual o valor exacto de toda a dívida de curto prazo que o Município tinha no dia 31 de Dezembro de 2007, é claramente afirmar que os números que se irão discutir na Próxima reunião da Assembleia Municipal não são verdadeiros. E se não são verdadeiros, é porque são falsos.
Se os números são falsos qual deverá ser o papel da Assembleia Municipal? O que é que ela irá discutir e aprovar?

Para todos aqueles a quem este assunto possa incomodar e que diante das más notícias optam por enterrar a cabeça na areia peço que parem por aqui. Não leiam mais!

Para os outros que pretendem conhecer melhor o meu pensamento sobre os números desta Prestação de Contas de 2007, pejada de vícios e erros grosseiros, convido-os a conhecerem 4 exemplos.

Exemplo 1 – Há um ano, e aquando da Discussão e Aprovação da Prestação de Contas de 2006, o Sr. Presidente da Câmara, diante do volume das dívidas de curto prazo acumuladas, apontava para a necessidade de se estabelecerem medidas eficazes com vista à redução da dívida de curto prazo. O volume dessas dívidas era tão grande que criava ao Município um enorme problema estrutural de liquidez geral.
Um ano depois, as dívidas aumentaram e a solução preconizada há um ano é colocada de novo como sendo uma prioridade para o Município.
Diante deste cenário impunha-se que se conhecessem as razões porque tais dívidas cresceram e logo num ano em que houve um aumento real das Receitas Correntes.
A resposta do Sr. Presidente da Câmara foi. “ … é evidente o facto de haver situações em que a dívida aumenta por haver facturas que não se encontram ainda registadas em Dezembro e que só são lançadas em Janeiro. É relevante que com o QREN parado, houve necessidade de se avançar com algumas obras, o que veio originar mais despesas. O aumento de receita originou também que se tivesse reduzido algumas despesas. Houve um aumento de custos relacionados com as novas competências relacionadas com as Escolas e que as obras que têm decorrido na Casa Grande vieram agravar mais, dado ser uma despesa corrente…” (páginas 14 e 15 da Acta 7/2008).
Conforme atesta a própria acta da reunião e na presença de tal resposta, a minha reacção foi perguntar ao Sr. Presidente da Câmara se ele estava certo de tudo aquilo que afirmara. Confesso que ainda hoje não consegui perceber aquela resposta. Não foi só na dissertação contabilística que não percebi, foi na justificação das obras que se fizeram. Segundo afirmou, algumas dessas obras foram responsáveis pelo agravamento da dívida, especialmente a verificada na Casa Grande. Perguntei a mim próprio: “ – Que obra é esta e que investimentos foram feitos na mesma durante o ano de 2007?”. Peguei na Prestação de Contas de 2007 e na sua página 33 lá encontrei.: (Projecto 2001/28 1 - Recuperação do Corpo Central da Casa Grande ou dos Almeidas - montante executado durante o ano de 2007 de 0 (Zero) Euros). Mau! (disse para comigo) Há aqui qualquer coisa que não bate certo. Fui aos Anexos da Prestação de Contas e no Capítulo referente ao Apuramento de Custos das Obras por Administração Directa (página 4/18) pude ler “ (Projecto 2001/28 1 - Recuperação do Corpo Central da Casa Grande ou dos Almeidas – Trabalhos executados entre 08/10/2007 e 31/12/2007 – Valor total dos trabalhos 10.173,00 €, sendo 275€ de Materiais, 264€ de Viaturas e o resto (9.634€) de Mão de Obra”. Sabendo que a Mão de Obra registada se reporta aos trabalhadores do quadro da autarquia afectos àquela obra, sou obrigado a concluir que o agravamento a que o Sr. Presidente da Câmara se referia se devia a 275 € de Materiais, dado que até as viaturas deveriam ser as pertencentes ao Município. Sem palavras!!!

Exemplo 2 – Um dos registos que qualquer Prestação de Contas deverá conter é a lista de todas as entidades a quem o Município tem dívidas de curto prazo. A Prestação de Contas de 2007, cumprindo tal disposição, apresenta entre as suas folhas 155 e 171 as entidades a quem se devia no dia 31 de Dezembro de 2007 e, ainda, o seu valor. Da sua leitura poderão ser extraídas várias curiosidades. São 369 as Entidades a quem se devia no dia 31 de Dezembro de 2007. Estas dívidas de curto prazo perfazem um total de 2.057.415,35€ e os seus valores variam entre 0,95€ (o mais baixo) até 243.810,82€ (o mais alto). Contudo, é um registo destas dívidas que me chama a atenção. Na página 170, à entidade Fernando José da Silva Morais (26869001373) é referido que a dívida da Câmara em 31 de Dezembro era de 174,36€. Esta dívida dizia respeito ás senhas de presença. Compulsando os meus apontamentos verifiquei que aquele valor não estava correcto. A dívida era de aproximadamente 232€ e a mesma já havia sido liquidada (no dia 23 de Janeiro 174,36€)e no dia 20 de Fevereiro 58,12€). Diante deste conhecimento e percebendo que, no meu caso e no caso do Pedro Duque, as dívidas registadas na Prestação de Contas de 2007 apresentavam valores inferiores aos reais, questionei-me sobre se não haveria outros casos similares. Entendi por isso questionar sobre o assunto. Perguntei então ao Sr. Presidente da Câmara se ele estava em condições de confirmar que a dívida de curto prazo e a terceiros no valor de 2.057.415,35 € e referente ao total acumulado no dia 31 de Dezembro de 2007 era real, que não existiam outras facturas por pagar para além das apresentadas na Lista constante na Prestação de Contas de 2007, que por motivos diversos não haviam sido incluídas na citada lista apresentada. Passo a transcrever a resposta que obtive e que se encontra registada na página 19 da Acta da Reunião “… Sobre esta pergunta o Senhor Presidente da Câmara respondeu que de momento não está em condições de lhe dar uma resposta. Também não sabe se os serviços estão em condições de poder satisfazer o pedido…”. Sobre esta impossibilidade interveio também o Sr. Vice-Presidente para referir “…que de momento não têm capacidade de dar uma informação mais concreta dado as limitações do próprio programa informático e os Serviços ainda não possuem todos os dados…”. Como é possível que, com todos os meios informáticos e técnicos habilitados para o efeito que hoje o Município dispõe, e passados mais de 3 meses depois do fecho do ano de 2007, o Sr. Presidente da Câmara possa afirmar que desconhece estarem os serviços da autarquia em condições de poderem saber o valor real da totalidade das dívidas a terceiros e de curto prazo no dia 31 de Dezembro de 2007? No meu caso particular a dívida ficou saldada no dia 20 de Fevereiro. Isto é, no limite, no dia 20 de Fevereiro os Serviços já sabiam que o valor real da dívida para comigo e para com o Pedro Duque não era a registada. Perante tudo isto volto a perguntar: Qual era a verdadeira dívida de curto prazo e a terceiros que pendia sobre a Autarquia Sardoalense no dia 31 de Dezembro de 2007? Alguém me sabe dizer?

Exemplo 3 – Pelo 3º ano consecutivo que quer eu, quer o Pedro Duque, quer todos os membros da Assembleia Municipal afectos á Bancada do Partido Socialista vêem denunciando a existência de um erro grosseiro no registo de alguns dados de alguns projectos nas Grandes Opções do Plano. As Grandes Opções do Plano são um capítulo da Prestação de Contas no qual são registadas as previsões e os resultados obtidos durante a actividade anual da Autarquia. Muitos desses projectos são plurianuais obrigando com isso a que no final de cada ano se apurem não só os montantes anuais executados, mas também o acumulado executado nos anos anteriores. Esse erro grosseiro assentava no facto dos valores acumulados registados no dia 31 de Dezembro de uma Prestação de Contas não serem os mesmos dos registados no dia 1 de Janeiro da Prestação de Contas do ano seguinte. Nunca percebi como é que o total acumulado pela execução de um determinado projecto no dia 31 de Dezembro à meia-noite, não era o mesmo às zero horas do dia seguinte. Uma vez mais se repetiu este tipo de registos!
São vários os projectos que aqui poderia descrever, mas fico-me apenas por três: Barragem da Lapa, Centro Cultural Gil Vicente e Biblioteca Municipal. Atente-se nos valores registados nesta Prestação de contas de 2007 e nas anteriores até 2003:

Barragem da Lapa (Construção)
Prestação de Contas de 2003
- Acumulado executado até 01/01/2003 = 3.832.982,00€
- Executado em 2003 = 40.985,02€
- Acumulado executado até 31/12/2003 = 3.873.965,02€
Prestação de Contas de 2004
- Acumulado executado até 01/01/2004 = 3.863.033,00€
- Executado em 2004 = 280,23€
- Acumulado executado até 31/12/2004 = 3.863.313,23€
Prestação de Contas de 2005
- Acumulado executado até 01/01/2005 = 3.802.667,00€
- Executado em 2005 = 1.210,17€
- Acumulado executado até 31/12/2005 = 3.803.877,17€
Prestação de Contas de 2006
- Acumulado executado até 01/01/2006 = 3.832.835,00 €
- Executado em 2006 = 0,00€
- Acumulado executado até 31/12/2006 = 3.832.835,00€
Veja-se agora o que revela a Prestação de Contas de 2007
- Acumulado executado até 01/01/2007 = 3.960.588,00€
- Executado em 2007 = 12.805,12 €
- Acumulado executado até 31/12/2007 = 3.873.965,02€

Centro Cultural Gil Vicente (Construção)
Prestação de Contas de 2003
- Acumulado executado até 01/01/2003 = 0,00€
- Executado em 2003 = 1.872.727,35€
- Acumulado executado até 31/12/2003 = 1.872.727,35€
Prestação de Contas de 2004
- Acumulado executado até 01/01/2004 = 1.802.879,00€
- Executado em 2004 = 711.447,51€
- Acumulado executado até 31/12/2004 = 2.514.326,51€
Prestação de Contas de 2005
- Acumulado executado até 01/01/2005 = 2.725.956,00€
- Executado em 2005 = 196.183,11€
- Acumulado executado até 31/12/2005 = 2.922.139,11€
Prestação de Contas de 2006
- Acumulado executado até 01/01/2006 = 2.785.421,00€
- Executado em 2006 = 17.580,78€
- Acumulado executado até 31/12/2006 = 2.803.001,78€
Veja-se agora o que revela a Prestação de Contas de 2007
- Acumulado executado até 01/01/2007 = 2.802.350,00€
- Executado em 2007 = 1.710,72 €
- Acumulado executado até 31/12/2007 = 2.804.060,72€

Biblioteca Municipal (Construção)
- Em 19/2/2002 (D.R. 2ª série – Folha 3188) total executado = 136.287,00€
Prestação de Contas de 2003
- Acumulado executado até 01/01/2003 = 4.346,00€
- Executado em 2003 = 288,84€
- Acumulado executado até 31/12/2003 = 4.634,84€
Prestação de Contas de 2004
- Acumulado executado até 01/01/2004 = 5.090,00€
- Executado em 2004 = 4.072,53€
- Acumulado executado até 31/12/2004 = 9.162,53€
Prestação de Contas de 2005
- Acumulado executado até 01/01/2005 = 10.691,00€
- Executado em 2005 = 296,72€
- Acumulado executado até 31/12/2005 = 10.987,72€
Prestação de Contas de 2006
- Acumulado executado até 01/01/2006 = 23.387,00€
- Executado em 2006 = 12.229,10€
- Acumulado executado até 31/12/2006 = 35.616,10€
Veja-se agora o que revela a Prestação de Contas de 2007
- Acumulado executado até 01/01/2007 = 52.864,00€
- Executado em 2007 = 8.181,81 €
- Acumulado executado até 31/12/2007 = 61.045,81€

Entendeu-se por isso questionar o Sr. Presidente da Câmara para que esclarecesse em que medida se poderia acreditar nos resultados registados na Prestação de Contas de 2007. A resposta veio da parte do Sr. Vice-Presidente da Câmara: “… Interveio o Senhor Vereador Luís Gonçalves para referir que sobre o assunto, continua a ser um problema técnico, estão a tentar aperfeiçoar o mesmo para o próximo ano…” (página 22, da Acta 7/2008). - Perceberam? Eu continuo a não perceber.

Exemplo 4: O Município possui um Sector que apura os custos resultantes da execução das actividades realizadas pela Autarquia, independentemente se tratarem de Actividades Correntes ou Obras por Administração Directa. São esses valores apurados que somados a outras despesas paralelas efectuadas (Exemplo: pagamento de facturas pendentes) que estarão na base dos valores registados nas Grandes Opções do Plano.
Continua a ser recorrente o facto de ao compararmos os valores encontrados pelo Sector de Apuramento de Custos e os registados nas Grandes Opções do Plano apresentarem diferenças significativas entre si. Já acima abordei o caso da Obra da Casa Grande que no apuramento de Custos apresentava o valor de 10.173€ como sendo o executado durante o ano de 2007 e nas Grandes Opções do Plano tal valor ser de 0€; poderia falar na Construção da Charca-Cova da Mascata que o Apuramento de Custos revela 4.599,92€ e as Grandes Opções do Plano mostram 0€; poderia falar da Conservação, Reparação e Beneficiação das ETAR´s, que o Apuramento de Custos apresenta o valor de 37.139,51€ e as Grandes Opções do Plano apresentam 0€; etc. “Cada tiro, cada melro”
Perante tais discrepâncias era essencial conhecer-se a posição do Sr. Presidente da Câmara sobre o assunto e sobre em que medida era possível acreditar-se nos resultados registados nas Grandes Opções do Plano. A resposta veio na pessoa do Sr. Vice-Presidente da Câmara a qual se encontra transcrita na página 22 da Acta 7/2008 “… Quanto á pergunta propriamente dita, interveio o Senhor Vereador Luís Gonçalves para referir que contabilisticamente, só tecnicamente será possível saber…” Perceberam? Eu continuo a não perceber.

Junte-se a estes 4 exemplos onde a falta de rigor e lógica dos números falam por si; o endividamento brutal a terceiros (nem quero imaginar a rotura financeira que poderá causar ao Município, caso este seja obrigado a pagar, num só mês, 10% do valor total acumulado da dívida existente. Nestes tempos, economicamente tão difíceis, também resta saber até quando estarão os credores receptivos a se manterem passivos); a falta de competitividade que o nosso Município revela quando comparado com os outros Municípios vizinhos e tudo o que (directa ou indirectamente) possa ter a ver com os resultados do exercício de 2007. Será tudo isto que a próxima reunião da Assembleia Municipal irá discutir e aprovar na próxima 3ª Feira.
Possivelmente uma das respostas que o Sr. Presidente da Câmara poderá apresentar para justificar a diferença dos números seja idêntica á que deu aos Vereadores quando estes lhe perguntaram qual a razão porque nesta Prestação de Contas de 2007, no Sistema de Controlo Interno, o Sr. José Curado ainda era dado como Vereador com Pelouros do Município, o Sr. Manuel Serras como pertencente ao Gabinete de Apoio ao Munícipe e o Sr. Manuel Chambel Gomes ainda era o responsável pelo Gabinete Técnico. Os dois primeiros já não exercem tais funções desde Novembro de 2005 e o último já falecera em Agosto de 2003. Diante desta evidência respondeu: “ … que era uma questão de pormenor”.

Depois desta “maratona explicativa” será que ainda existe alguém capaz de votar favoravelmente os Documentos constantes da Prestação de Contas de 2007?
Eu e o Pedro Duque já votámos contra!
Quem mais nos seguirá!

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